Herança: há diferença entre a união estável e o casamento?
Por Anderson Albuquerque
Praticamente todos os dias lemos ou escutamos notícias sobre conflitos entre casais com relação à herança. Muitas dúvidas surgem quando tem início a partilha de bens, pois diversas mulheres desconhecem seus direitos.
?? importante, inicialmente, saber a diferença entre a união estável o casamento civil. O Código Civil de 2002, em seu artigo 1723, determina que, para que seja caracterizada a união estável, é necessário que haja uma relação de convivência pública, contínua e duradoura entre o casal, e que haja o objetivo de constituir uma família.
Não é preciso, assim, que haja um documento assinado pelo casal ou um período determinado para que ela seja configurada. Como não há mais lapso temporal para sua caracterização, será a Justiça que analisará se trata-se ou não de uma união estável.
O casamento civil, por sua vez, é um ato formal, é o contrato de união de um casal sob o Direito Civil. O término do casamento civil só se dá através do divórcio, já na união estável fala-se em dissolução da união.
No casamento civil, como determina o artigo 1.829 do Código Civil, o cônjuge sobrevivente é herdeiro necessário, e concorre com os descendentes sobre os bens que não tem direito à meação.
De tal modo, a diferença fundamental entre o casamento civil e a união estável em relação à herança era que o cônjuge era herdeiro necessário e o companheiro não. Portanto, como a lei não estabelecia o companheiro como herdeiro necessário, era possível fazer um testamento e excluir o companheiro da herança.
O companheiro sobrevivente tinha direito à herança somente dos bens adquiridos de forma onerosa durante a união estável, mesmo que a união não estivesse sob o regime de comunhão parcial de bens.
Em 2017, o STF decidiu, por meio dos Recursos Extraordinários 646721 e 878694, que o artigo 1790 do Código Civil, que diferenciava a sucessão por morte entre companheiros e cônjuges, era inconstitucional, pois violava os princípios de igualdade, dignidade da pessoa humana, proporcionalidade e a vedação ao retrocesso.
Assim, o STF equiparou os companheiros e os cônjuges no que diz respeito aos efeitos sucessórios, incluso as uniões homoafetivas. Os direitos sucessórios resultantes do casamento civil e da união estável se tornaram equivalentes:
"Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: (Vide Recurso Extraordinário nº 646.721) (Vide Recurso Extraordinário nº 878.694)
I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;
II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III - ao cônjuge sobrevivente;
IV - aos colaterais."
De acordo com as novas regras, o companheiro sobrevivente pode herdar bens particulares obtidos pelo falecido de forma onerosa ou gratuita, o que era vedado pelo Código Civil (artigo 1.790).
Outra mudança é que antes o companheiro concorria com os descendentes e os ascendentes e os colaterais até quarto grau, e somente herdaria 100% dos bens se o companheiro falecido não possuísse parentes. Hoje, caso o companheiro falecido tenha apenas parentes colaterais, o companheiro sobrevivente herdará tudo.
Esta decisão é bastante polêmica, pois quando duas pessoas resolverem morar juntas e levar uma vida em comum, elas terão os mesmos direitos que uma pessoa casada civilmente.
O que pode acontecer é que pessoas que tenham conhecimento sobre os novos direitos sucessórios em relação à união estável fiquem receosas em avançar no relacionamento, de namoro a ir morar juntos, por exemplo.
Apesar disso, pode-se afirmar que a decisão do STF é uma evolução para o Direito de Família, uma vez que a união estável se tornou, atualmente, muito mais recorrente do que o casamento civil.
Anderson Albuquerque ??? Direito da mulher ??? Herança, casamento e união estável